Post musicado. Por play quando disser e só quando a barra estiver preenchida Estou de partida, minha gente... partida para algures onde não ninguém sabe como é. Tenho de ir... o meu tempo nesta terra finda-se ao segundo. O meu assassino será descoberto hoje, se a polícia conseguir somar dois mais dois... - Então aquele estúpido deixou e humilhou aquele pobre rapaz?
- Como posso ter eu estado apaixonada por aquele monstro? Como posso ter sido tão cega!
- O amor cega-nos...
- Estupidifica-nos... acho que é a palavra mais correcta!- Joana e Mariana sentavam-se à mesa, cada uma delas com uma chávena de chá. Joana estava com uma olheiras que lhe chegavam aos joelhos... Mariana estava cansada e irritada. As duas, nas duas horas anteriores, não tinham feito mais nada para além de criticar todos os homens das suas vidas. O único que parecia imune, ainda que fosse um perfeito desconhecido para ambas, era eu. Sentiam-se estranhamente complacentes com a minha situação.
- E novidades do caso?
- Nada... soube ontem pelo Bernardo que a única pessoa que poderia estar associada à sua morte, era o pai dele.
- Boa! Então não o podem prender?
- O pai dele, é o advogado Alberto! O amigo do teu patrão... não temos nada que aponte que tenha sido ele. Até o pode ter feito, mas então pediu a alguém para escrever a carta. Ah! E o Bernardo também me falou de alguém que tinha sido a causa da morte do avô do Carlos. Pelos vistos, alguém o enganou e o rapaz estava a reunir provas para o pôr atrás das grades!
-Hmmm. Bom, não sei...Tenho de ir embora. Não vais trabalhar hoje?
- Vou mais daqui a bocado.
- Então fica quanto tempo precisares querida. Beijinho. - naquele dia, Mariana ia trabalhar quase sem nada na pasta. Enquanto saía da casa e se despedia da sua gata, sentiu-se grande e importante. Por que seria?
Não sabia ela, que estava prestes a desvendar o mistério da minha morte...
*
A luz está mais próxima... e eu cada vez mais longe da vida. Ai, como posso ter eu não aproveitado cada momento? Como posso eu ter ficado aqui parado, inerte, esperando que a vida e a solidão me atravessassem, sem que eu tivesse qualquer controlo sobre elas?
*
- Bom dia Doutor.
- Mariana... queria falar consigo.
- Sobre?
- Sobre nós... não temos...- Mariana parou de arrumar as pastas e olhou nos olhos o patrão. Suspirando, ganhou assim forças para o enfrentar.
- Lamento doutor. Esse departamento já fechou. Nunca mais, se depender de mim, vamos ter relações sexuais. Acho que já desci baixo demais...
- O QUÊ?! Eu dei-lhe folgas e aumentos e agora nega-me a minha única fonte de prazer?
- Estou no meu direito! - disse indignada!
- Não, não está!
- Desculpe?!
- Eu sou o seu patrão! Eu mando em si! - Mariana sorriu-lhe e agarrou-lhe pela gravata!
- Não doutor. Você nem ninguém manda em mim. E a partir deste momento. Já deixou de ser o meu patrão... Eu demito-me!
- Não se demite nada! Eu é que a despeço. Acabe o trabalho que tinha para hoje e amanhã pode esquecer este trabalho! E este mês não vai receber um tostão!- gritou o advogado batendo a porta do seu escritório.
- Veremos... - murmurou Mariana.
Tendo pouco trabalho por fazer, Mariana decidiu acabar o arquivo e o resto que lhe faltava acabar. Decidiu começar por passar a carta do advogado a computador.
" Caro Senhor Abel. Venho por este meio informá-lo que qualquer decisão legal que o juiz possa vir a tomar contra o meu cliente, Dr. Alberto Fernandes, será acatada. Deste modo, proponho o seguinte pacto."
Mariana congelou... Aquela letra... seria? Ou estava a ficar maluca. Decidiu telefonar à Joana.
- Jo! Manda-me uma fotocópia da carta, por favor.
- Por quê?
- Depois explico! Por favor! Manda-ma já!
- Ok ok! Te já.
Mariana colocou-se ao pé do fax. Em pulgas, esperou 10 minutos, até que o fax começou a apitar. Ali estava a carta do meu assassino. Ali estava a carta que o seu patrão escrevera para um cliente. Tremendo... Mariana deixou-as cair... A letra era igual. O assassino era o Doutor Sampaio Neves, o homem com quem dormira.
Numa frenética busca, revirou todas as pastas com a fiscalidade do advogado. Numa verde, que dizia 2003/2004, lá estavam vários documentos importantes: Uma notificação da polícia, em como tinha sido constituído arguido num processo de fraude e falsificação; uma carta do juiz a combinar o valor do suborno; uma carta do tribunal a dizer que por motivos de falta de provas, o caso estava arquivado; e junto a elas... as cartas que Mariana tinha arquivado, pensando que se tratava de um cliente irritado, as cartas onde convenientemente tinham sido esborratadas por café. Aquele al.. não era de Alberto, mas sim de Carlos. Carlos Faria.
Mariana tremia agora por todos os lados.
- 'Tou Joana! Vem já para aqui! Eu sei quem é o assassino.
- O que estás para aí a dizer?
- É o advogado. O meu patrão! A letra é a dele e encontrei as cartas que o Carlos mandou para a pessoa que tinha sido responsável pelo suicídio do avô.
- O quê?
- Diz aqui: " Nunca o perdoarei por ter arruinado a vida da minha família... Tenho as provas necessárias para arruinar a sua!"
- Tens a certeza?
- VEM DEPRESSA! Estou em pânico!
- Mariana.- a porta do escritório abria-se. Mariana desligou apressadamente o telefone e arrumou a secretária.
- Sim doutor?- disse numa calma transtornada.
- Preciso que vá à farmácia buscar uma pomada para a pele seca. Qualquer coisa que segurei, deixou-me uma marca horrível na palma das mão, e está-me a fazer impressão.
Ao abrir a mão, lá se viam as marcas... ele próprio tinha morto Carlos. Aquelas marcas eram de uma corda!
*
Meia hora depois, para descontentamento de Mariana, a polícia chegou. Mal a viu, o advogado tentou fugir, mas em vão. A sua letra foi comparada pelos experts, com a letra da carta do assassínio; o seu carro foi passado a pente fino e no seu porta-bagagens, foi encontrado uma mecha de cabelo cujo DNA coincidia com o meu. As marcas da corda, a confissão do crime... e tudo mais, levaram o grande advogado à prisão. Porque o fizera? Simplesmente por pura ganância. O seu império estava construído sobre um monte de farsas e fraudes e não ia tolerar que um empecilho o derrubasse.
*
PLAY
- Caros amigos. Estamos aqui reunidos...
Na igreja do Estoril, juntava-se família, amigos e pessoas que não me conheciam. Lá estavam na primeira fila, os meus pais. Atrás, chorosa com uns grandes óculos de sol, estava Pipa, de mão dada com Pedro, ainda chocado e assustado por estar na igreja onde jazia o corpo daquele que tinha sido assassinado pelo seu próprio pai. "Que ninguém me reconheça!", pensou. Naquele momento, sentia só raiva da vida e uma grande compaixão pelo rapaz que abrira e remexera sem grande pudor, na sua pequena sala da morgue.
Ao fundo da igreja, sentava-se a psicóloga, também ela vestida de preto. Ao seu lado, Joana e Mariana sentavam-se quietas, cheias de respeito por um rapaz que tinham conhecido por minutos. Todas elas achavam estranho o facto de todas aquelas pessoas estarem ligadas por algum motivo. Neste caso, por mim: Pedro, porque o pai me matara e porque namorava com Pipa. Vanessa por ser minha psicóloga e minha vizinha. Mariana pelo hospital, e Joana, ainda que de uma forma quase cruel, pelo Bernardo.
- Ide em paz irmãos. Que este dia, seja um dia de luto para todos nós.
O corpo que correspondia a esta alma penada, era agora carregado dentro daquele pedaço de madeira, por diferentes primos e pelo meu pai. Com pesar, o meu caixão foi atirado para dentro do carro funerário e levado para aquela pequena localidade com que eu gozara anteriormente. Um lugarejo chamado Alto dos Gaios.
Aí, o meu caixão foi descido, ao som dos choros e lamurias de várias pessoas. Entre elas, aquelas quatro raparigas que melhor ou pior me conheciam e que se mantinham ali junto a mim, naquele que era o meu último dia neste mundo.
- Joana, aquele não é? - era sim! Ao fundo, vestido de preto, com uma rapariga no braço, era Bernardo. Parecia que até os monstros conseguiam ter um mínimo de respeito por alguém.
- Porra! O que faz ele aqui?- disse Joana. Pipa estava ao lado e olhou também. A rapariga ao lado de Bernardo era a Sofia. Pelos vistos, ele não me respeitava minimamente...
Subitamente, sem controlo de si, fervilhando por dentro, deixou a campa e andou para ele.
- Pipa, como estás? Eu vim...- mas Bernardo não acabara a frase. Uma mão em forma de punho estava já a percorrer o ar em direcção à sua cara, acertando-lhe nos dentes incisivos.
- Isto é pelo que fizeste ao Carlos. - ao longe Joana ria-se da situação e quase que aplaudia.
- Estás parva?- as palavras saíam-lhe de uma forma esquisita, como se lhe faltassem dentes. E de facto, faltavam-lhe. Mal tirou a mão da frente, a sua boca foi revelada. A vingança estava consumada. Pipa partira-lhe aquele sorriso sedutor. Os dois incisivos da frente tinham-lhe saltado do sítio e estavam agora no chão.
- E tu minha puta! Vai-te embora!- disse Pipa voltando para junto de Pedro, que caladinho, não fez qualquer menção em ajudar a irmã.
- Prazer! Joana. A ex-namorada do Bernardo!- apresentou-se ela a Pipa, congratulando-a pela atitude.
Quando o funeral acabou, Pipa largou por momentos o Pedro e juntamente com a Vanessa, a Joana e a Mariana, decidiram ir tomar um café e falar daquele rapaz que toda a gente conhecia tão mal...
*
Adeus vida... hoje eu parto.
Meu amor... que te perdi tão bem perdido... e estranho é que me arrependo por vezes, quando só eu sofri... Mas não te prendas tu com meu sofrimento. Voa para longe, e poisa teu veneno na alma de quem te quer. Mas que um dia, por mera vingança do destino, e para contentamento meu... que alguém te magoe a alma, como tu magoas-te o espírito meu...
Adeus...
Adeus...
...
---FIM---